25.3.09

Eros, dores e Isadorias



Ela chegou pisando a pés descalços a camursa anil macia, tinha os cabelos ruivos soltos num maleixo sensual raro, os lábios especialmente róseos, entreabertos e o corpo nu.A casa era estranha, silenciosa e desconhecida. Como eles teriam ido parar ali? Tudo era vago e não objetivo, como num sonho. Se era tarde, ou noite, eles não sabiam porque as janelas estavam cerradas. Ela era setentrional ou boreal ele não sabia, porque naqueles dias nada mais fazia sentido a não ser a vontade. Antes tudo era verborragia, raciocinio, mentira e palavreado, e agora que estavam nus, todos esses acessórios já não se recombinavam a fim de produzierem nenhum tipo de ordem lexical.
Ele a fitava de longe, em sua nudez pálida e já não procurava entendê-la. porque a verdade dela era uma asa de borboleta furta-cor, mudando a cada segundo. Ela por sua vez, já não tentava satisfazê-lo porque nos olhos dele havia uma sombra, que se aconchegava mais facilmente ao palácio da angústia. Havia naquele homem um prazer na insatisfação, um gozo em ser movido a dúvidas, e aquela mulher era puro mistério de bruxas, fantásmas, mares, ventanias, entidades e terreiros. Eles se imantavam num tropismo louco pelo sombrio, pelas coisas tristes e ocultas. e assim, nus, é que eles se sabiam por completo.

Ele engoliu-a com os olhos algumas vezes, tinha um cigarro na mão direita e um esquerdo pensamento: maldita! Ela se gracejava nua, se movia, e quase dançava em distraídos apelos femininos. Ele fitava ereto e praguejava numa prece aos avessos, num ritual de excitação a que ele se submetia. Maldita! Ela percebia tudo por detrás das pupilas cautas e sorria, movendo alguns poucos músculos da boca farta , invocava-o com os cílios e o possuia com seu olhar bruxo, e como era bruxo, bacante e malicioso e puro, sem querer. Porque eles sabiam bem que não há nada tão puro quanto um desejo selvagem cilindrando-se como uma gota de orvalho, aviltando-se perene, segundo após segundo, milimetricamente, para enfim explodir no ar.

Ele pousou os dedos naquela boca úmida de pintanga, e o seu sorriso mudava-se como um mosaico sensual de escamas de serpente. Ela molhou-lhe o dedo médio na saliva quente e fitava-lhe estranhamente os olhos enquanto cobria com a língua de rio, o dedo de terra e ferrugem daquele homem. Maldita! ele murmurava por dentro enquanto era tomado por uma fúria de macho que lhe agitava os músculos todos. Ele tomou-a forte pelos cabelos e engoliu os seus seios cáusticos no chão camúrseo do quarto frio. Ela se atrelava e se esforçava, mas deixava escapar uns soluços de de gozo contrito. E então ele possuiu aquela mulher que era toda uma ventania vindo de alguma núvem impetuosa, e ela conduzia atrevida, cavalgando a floresta mística e úmida dos corpos, oferecendo a sua noite triste de mulher para ser penetrada com força, por um cavaleiro tétrico em sua armadura de desejo.

A tempestade prosseguiu aos raios, relâmpagos e ventos impetuosos e sórdidos, atiçando a cavalaria dos espíritos, arrebatando tudo o que está passível de fazer sentido num ciclone não arrebatável, naquele quarto escuro, esconderijo das mentes sombrias e eles, suados e cúmplices e passivos do crime dos que se amam, gozaram com a cor sanguínea de todos os túmulos nos olhos

e depois que a claridade fúnebre do prazer invadiu o quarto eles estavam vivos de novo... homem e mulher.


(para Isa- que bem entende de amor, porque o amor é não entender)

3 comentários:

Jay disse...

Isso se trata mais de amor do que encontro de corpos.
E realmente, amor é não entender...de NADA.

amo vc, niks

Johnny disse...

palavras romanticas, erotismo simbólico, sexo e morte.
sinceramente, é um texto maravilhoso..
achei complexo, e simbólico! mas muito bom!
gosrei realmente, e queria ter escrito isso "e ela conduzia atrevida, cavalgando a floresta mística e úmida dos corpos, oferecendo a sua noite triste de mulher para ser penetrada com força, por um cavaleiro tétrico em sua armadura de desejo." :/
ahahahha

Anônimo disse...

Após quase quatro anos, maravilha lembrar do que já fomos, para continuar lembrando do que sempre seremos: mulheres antes de tudo, bordadas em versos, meio prosas, lúcidas, loucas, fortes. Imantadas pelas palavras rocks de sentimentos quentes e nobres. Um "muito obrigada", que eu nunca disse para uma mulher tempestade que estará sempre em minha bibliografia dos bons ventos. E flores, muitas flores. Isadora Isa