27.2.09

O homem sem rosto

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A menina viu de sobressalto no livro de gravuras um homem sem rosto na estação de trem. E naquele momento ela entendeu como funcionava toda a parafalhoca do universo:




E foi assim que ela aprendeu a amar as pessoas como uma desesperada, crente que os desesperados é que eram felizes, certa de que tudo que é vivo vai. Até o que não o é, as pedras se partem, as nuvens se desfazem qual renda de vestido de noiva, as noivas viram retratos na parede e depois viram histórias que alguém conta, e esse alguém também parte, e as pedras se repartem novamente e viram vulcões derretendo tudo ao redor, pergunte a alguém que viu da estrada, pergunte porra, as histórias não morrem. O amor não morre, as casas vão ao chão, os grilos cantam nos escombros, as folhas sorriem para a chuva. Você vê? Conta pra mim que eu também te conto! Abraça me, não deixa isso passar, não vê como os relógios também se liquefazem? Quisera eu bebê-los em uma taça agora! Não vê que os sofás mudam de cor e os cigarros queimam e jamais serão os mesmos de antes. Mas por favor, me diga que tu ficas para sempre... Fique meu amor, fica meu amigo, fica meu cão de olhar triste, fica mãezinha querida, terna e lactante. Não vá embora, não deixe o samba morrer, ainda há mais carnavais para uma mulata sambar com a flor nos cabelos, e os cabelos ao vento têm um cheiro bom que só os vagabundos de alma podem sentir. Fique coração palpitante, há uma luz no fim do beco. há um pobre homem esperando com um sorriso triste a sua hora da estrela, não muito longe daqui..

E ela sentiu tudo isso no seu corpo e no seu espirito e ESTREMECEU. Quase chorou, mas tinha aquela sensação estranha de torpor. Não queria mais fingir que não conseguia ouvir agora o barulho do trem partindo, o cheiro que isso tem. O Tum Tum Tum que isso dá, das rodas do trem girando, do universo girando, das rosas, das rodas vivas e dos universos circulares. Ela, pobrezinha tão pequena entendeu Platão, Sófocles, Demétrio e o caralho a quatro, entendeu bem o que todos diziam: Oh estavamos todos entorpecidos pela existência e a hora era agora de compartilhar a existência juntos. Viver como loucos e viver DEMASIADAMENTE, sorrindo ou chorando, Viva La vida! E a felicidade não era só uma palavra que ela havia lido num conto infantil. Não, a felicidade era muito mais, era um gás entorpecente e colorido que se difundia rapidamente e sumia. Tinha cor de pôr-do-sol a felicidade! Ela queria tomar um pouco disso nas narinas bem agora e sorrir, ela sentiu tudo isso ao mesmo tempo e numa fração de segundos. E ela sentiu que não havia segundos para segundas para lamentações. O tempo fazia um ângulo perfeito e circular. Ela ouviu de repente os sinos e sabia que não havia mais volta. E ela tocou tão rapidamente os cabelos da morte que seu corpo inteiro se resfriou num arrepio. Mas oh pequena, meu amor, minha princesa, não tenha medo que eu te dou a mão, vamos nos abraçar agora, não há tempo. O tempo passou correndo por aqui, saltou a minha janela, tropeçou.Você viu? O tempo passou gritando e uivando e gotejando bem acima dos nossos olhos. O tempo chorou e agonizou bem agora nos nossos ouvidos exatmente enquanto ela fitava no livro de gravuras um homem sendo deixado para trás na estação de trem. Era um homem sem rosto. Ela sentiu na hora exata em que via,a meninha. Tão pequena e sentiu como a mala fedia e cheirava mal. O tempo contava 5 e poucos anos e ela sabia que seus alvéolos suspiravam desesperados por algo muito maior que o ar.Oh linguagem estrelar e criptogafada que tem o tempo. Todos nascemos a fim de nunca compreendê-la.

E por isso hoje ela conta. ela me contou aqui no meu ouvido agora. Ela me pediu em segredo e não quer que isso vá. Ela disse: força lua, força céu, força mar e força ventania. Não deixe o tempo chorar agora. Veja como ele dança suave nas suas mãos. Não permita que ele se recoste numa caixa de madeira qualquer. Ela disse me baixinho, força Beta, força Alfa, força Gama e força Epilson. A dança do céu não pode parar. Senta aqui e vamos falar da vida, das histórias que recordamos, me dá um trago, e um copo, e um lenço para essas lágrimas que insistem em cair,de alegria ou de dor.Conta-me! Vamos entender todas as coisas e vamos viver certos de que a dor e a ferida nos levam para frente! Vamos cantar aquela velha canção juntas. Sim, ela toca misteriosamente em todos os bares do mundo, por isso, vamos viver certos de que bem e mal são palavras que se confudem e que não interessa muito no que você acredita, sempre existem mil lados e o que importa mesmo é contar uma história. Conta que eu te conto, mas não deixe isso passar!

Ela então sentiu dor, a dor se saber que não havia nada por fazer a aquele homem vivo, sem rosto. Ela sentiu o espirito encolher e desejou um abraço forte e eterno naquele momento e uma voz que dissesse: Eu te amo, menina, não importa nada agora, nada importa. Chora essas tuas lágrimas presas meu amor, deita comigo na rede e chora. Me beija, vamos viver como os desesperados, rastejando pela adorável luz. Vamos! Há outras redes, há um canto azul logo ali.Vem amor, olha pra mim agora, no fundo dos meus olhos, meus olhos são de nuvens, lago e fumaça. Veja, pequena, há um sol esperando louco para gritar mais uma vez pro mundo o grito mudo: vivam porra! Vivam como se fosse a última vez. Vivam como se essa ferida fosse estranha, vivam como se o trem fosse passar aqui em cinco minutos. Vivam como se fosse fosse a última chamada, o ultimo beco com luz pendendo sobre a mesa!

E depois que aquilo acabou, ela fechou o livro de gravuras sobre o peito, e o coração dela estava quente, cheio de descobertas.

E o homem sem rosto ficou para trás, no meio da multidão sem rosto. Mas ela viu, ela se lembra, e era como olhar as estrelas que jamais serão as mesmas, dançando.porque as estrelas também dançam e choram e depois se vão eternas no conto de alguém que conta, e nada passa,tudo fica para sempre, só o tempo, o tempo descarado é que some na estação de trem, o tempo vira as costas e some, sem pena, sem rosto...



-A um beco eterno de estrelas: Beta, Gama, Alfa e Epilson, que sabem bem e no fundo quem elas são porquê disso tudo, e estão agora, exatamente sobre a linha do horizonte do meu ainda belo horizonte....


Fiquem!





" Que tristes os caminhos se não fora a mágica presença das estrelas" - Quintana


beijos cósmicos


nika


Um comentário:

Anônimo disse...

Um beco, eterno, de estrelas!
Eterno entre vírgulas! Jamais serão esquecidas as horas que passamos juntas!

amo vocês, é pra sempre!